Quais obras serão pedidas no Vestibular Unicamp 2025?

Quais obras serão pedidas no Vestibular Unicamp 2025?

O vestibular 2025 da Unicamp está chegando e daqui menos de dois meses, milhares de estudantes tentarão ingressar em uma das maiores universidades do país. Para isso, é preciso se atentar para alguns livros básicos, que serão os pilares fundamentais para responder algumas questões. Confira a análise do André Barbosa, professor de Literatura do Curso e Colégio Oficina do Estudante, sobre cada obra que será pedido na prova deste ano, incluindo obras musicais.

A vida não é útil – Ailton Krenak

Pode-se compreender o livro de Krenak como filosofia – afinal, o volume reúne cinco ensaios reflexivos cujo ponto de ponto de partida é o pensamento de um representante dos povos originários brasileiros (aliás, um representante por excelência, já que o escritor se tornou recentemente o primeiro indígena a ser eleito para uma cadeira na Academia Brasileira de Letras, fato que dá conta de seu prestígio em ascensão).

A vida não é útil é obra de lançamento recente (2020), criada sob o impacto da pandemia de covid-19. Seu eixo principal é a crítica à atividade predatória do homem no planeta, impulsionada pelo consumismo e destruição da natureza. Segundo Krenak, a vida não se destina a uma utilidade prática e imediata, mensurável pelo dinheiro e pelo acúmulo de bens.

Quanto aos aspectos formais, é importante que se atente à oralidade como fator estilístico dos textos, uma vez que a origem dos ensaios não é de modalidade escrita, mas oral – o que evidencia, mais uma vez, a ancestralidade indígena do pensamento e da linguagem do autor.

Alice no país das maravilhas – Lewis Carroll

Com o famoso pseudônimo Lewis Carroll, o escritor e matemático Charles Lutwidge Dodgson assina a história da menina Alice: ao perseguir um apressado coelho branco, ela é levada a um lugar inusitado, onde vivem seres incrivelmente peculiares, como a autoritária e sanguinária Rainha de Copas, o Chapeleiro Louco e o Gato de Cheshire – todos eles ícones do non sense através dos tempos.

Colocada incessantemente perante situações absurdas, a criança põe em xeque tudo que aprendera até então. De simples obra criada inicialmente como forma de entretenimento, a narrativa de Lewis Carroll (publicada em 1865) desafia classificações e categorizações, persistindo até hoje como um clássico do non sense – a ausência ostensiva de um sentido lógico imediato.

Canções escolhidas – Cartola

Já tem se tornado comum a seleção de obras musicais no rol das “leituras” obrigatórias da Unicamp: desde a escolha do disco Sobrevivendo no inferno (Racionais MC’s), presente em edições passadas, a Comvest não surpreende o vestibulando ao privilegiar o cancioneiro nacional, desta vez com dez canções do compositor carioca Cartola (1908-1980): “Alvorada”, “As rosas não falam”, “Cordas de aço”, “Disfarça e chora”, “O inverno do meu tempo”, “O mundo é um moinho”, “Que é feito de você?”, “Sala de recepção”, “Silêncio em cipreste” e “Sim”.

Entre os temas constantes nas canções, destacam-se o lirismo amoroso, o sofrimento pela ausência da pessoa amada, a dolorosa passagem do tempo e a devoção à escola de samba Estação Primeira de Mangueira, que tem Cartola como um de seus pilares. Convém ao vestibulando apreciar a escuta das canções e, evidentemente, analisar as letras sob um viés estilístico e histórico.

Casa Velha – Machado de Assis

Como é comum na prosa do autor, Casa Velha aborda as relações familiares e sociais da elite brasileira do século XIX. No enredo da obra, um padre com ambições de historiador (o narrador-protagonista) deseja escrever um relato sobre o Primeiro Reinado. Para tanto, pesquisa documentos na casa de um falecido político; com o passar do tempo, o religioso se torna amigo da família, aproximando-se inconvenientemente de seus membros e se envolvendo indiretamente em suas tramas pessoais e flertes amorosos.

Apesar de ter sido publicada originalmente entre 1885 e 1886, a narrativa Casa Velha só receberia a devida atenção de críticos e estudiosos a partir de meados do século XX. Não se trata de uma das obras-primas do autor de Memórias póstumas Brás Cubas, Quincas Borba e Dom Casmurro, mas de um livro que ficou em relativo esquecimento por muito tempo e que agora ganha os holofotes do meio estudantil, dada a seleção pela Comvest (Unicamp).

Morangos mofados – Caio Fernando Abreu

Publicada originalmente em 1982, a coletânea de contos de Caio Fernando Abreu é marcada por um estilo ácido e contundente, típico de uma prosa combativa e ostensivamente política. Afinal, as dezoito narrativas curtas têm como pano de fundo a decadência iminente da ditadura militar no Brasil, poucos anos antes da redemocratização.

Tratando da ambivalência entre afetividade e repressão, os contos de Morangos mofados dialogavam diretamente com leitores alinhados à contracultura como meio de oposição ao militarismo e a práticas repressoras.

Convém notar que a Comvest (Unicamp) não exige a leitura integral do livro, mas somente seis contos selecionados: “Diálogo”, “Além do Ponto”, “Terça-Feira Gorda”, “Pêra, uva ou maçã?”, “O dia em que Júpiter encontrou Saturno” e “Aqueles dois”.

Niketche – uma História de Poligamia – Paulina Chiziane

Trata-se de um romance moçambicano contemporâneo cujo tema é, evidentemente, a poligamia. A narrativa discorre sobre o papel da mulher na sociedade de Moçambique e a respeito das diferenças regionais que caracterizam a nação. A obra privilegia as histórias de mulheres que simbolizam a diversidade cultural do país; entre elas, há a presença de um único homem (o instável Tony), que pode ser compreendida como uma alegoria da frágil unidade nacional.

O título do livro é o nome de uma dança ancestral de iniciação sexual muito popular em Zambézia e Nampula, regiões localizadas ao norte de Moçambique.

Olhos d’água – Conceição Evaristo

Trata-se de uma coletânea que reúne quinze contos cujo ponto em comum é a abordagem literária de pessoas negras (mulheres, em especial) que passam por constantes formas de desprezo e violência. No entanto, paralelamente às

narrativas de sofrimento, o leitor é levado ao contato com a ancestralidade afro-brasileira, de modo que as situações de amargura se entrelaçam vivamente à expressão de resistência.

Não se pode ignorar o principal aspecto estilístico de Conceição Evaristo, patente nos contos de Olhos d’água – a “escrevivência”, ou seja, a produção literária efetivada a partir do conhecimento vívido da experiência humana, de modo que o lugar de enunciação simultaneamente negro e feminino se caracteriza como um potencial índice de identificação com o leitor.

Prosas seguidas de odes mínimas – José Paulo Paes

Trata-se de um livro conciso, com 33 poemas curtos, em geral caracterizados por ironia, consciência da proximidade da morte e rejeição ao sentimentalismo. Como informa o título, a obra é dividida em duas partes. A primeira reúne o que o autor chamou de “prosas” (apesar dos textos em verso), por haver nela alguns poemas de teor narrativo. Já na segunda parte (“odes mínimas”), o eu-lírico se ocupa com uma poética do cotidiano, tratando de elementos corriqueiros, como “garrafa” e “bengala”. Com isso, ironicamente, o poeta subverte o conceito de ode.

No contexto clássico, essa tradicional forma poética tinha a função de homenagear feitos heroicos e gente ilustre; o poeta das “odes mínimas”, por sua vez, valoriza objetos geralmente ignorados. Como mecanismo de paródia e ruptura, a ode, de acordo com Paes, atua para a apreciação ou o elogio irônico do objeto tratado.

Vida e morte de M.J. Gonzaga de Sá – Lima Barreto

Trata-se de um dos livros menos conhecidos de Lima Barreto. Apesar disto, é um dos romances mais importantes do Pré-Modernismo, dado o caráter inovador da narrativa, que rompe com convenções formais ainda dominantes em outras obras do próprio Lima Barreto.

O livro é constituído por 12 capítulos curtos, que podem ser considerados independentes, já que não apresentam qualquer progressão – o enredo evolui a partir das reflexões e diálogos presentes. Nesta narrativa fragmentária, os acontecimentos se apresentam quase aleatoriamente, obedecendo apenas aos flagrantes captados pelo olhar dos personagens.

O narrador-personagem, o jovem Augusto Machado, expõe inicialmente as razões que o levaram a escrever a biografia de seu amigo Manuel Joaquim Gonzaga de Sá. A mobilidade dos dois amigos, que caminham pelos espaços da narrativa, coloca-os em vários pontos do Rio de Janeiro, os quais constituem a própria matéria do relato. Deslocados no meio em que trabalham (repartições burocráticas), os dois personagens buscam refúgio para a própria solidão nas ruas cariocas, onde as reflexões de Gonzaga de Sá ganham contorno.

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